Marco com traço vertical
o início da linha:
04-10 nasci
antes disso não era
no outro dia
ainda que ontem
não estava
Contorno a linha
com um círculo
como mais a frente farei
quando nascerem os meus filhos
e como faria neste outubro distante
minha mãe que já não é
o tempo então
será uma reta
uma curva
ou um desenho em espiral?
9x5
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Não tenho a menor idéia da minha lembrança mais antiga. Invejo os que afirmam com toda segurança que foi a avó sorrindo debruçada no berço, um joelho arranhado ou qualquer coisa assim. Não que a lembrança faça falta, mas seria um bom começo.
Imagino que tenha sido muito feliz nos meus cinco primeiros anos porque tristeza deixa cicatriz e eu não encontro nenhuma. Lembro do cheiro de pó nas cortinas, a rua já naquela época era movimentada. Do espelho grande da penteadeira da mãe, da dama antigo com flores no colo, das japonesinhas de pernas de arame, que intrigante aquilo, tão lindas e não tinham pernas, de um radio cinza claro e dos abajours, seja lá como se escreve isso.
Lembro da mãe chegando para deitar com cheiro de sabonete, de ouvir histórias do meu pai, da minha cama cheia de travesseiros. Lembro que os travesseiros tinham nome, mas não lembro o nome de nenhum. Lembro dos pais conversando em voz baixa coisas que eu não teria como entender.Essas coisas, cheiros, sussurros, sei que são lembranças, não estão em fotos nem em nenhuma história que alguém tenha me contado depois. O resto não tenho tanta certeza.
Foi nessa época que o homem chegou a lua. Quando fiz uma entrevista para entrar na escola li a palavra ASTRONAUTA na última capa de uma revista. Não me lembro de mais nada a respeito, diferente do meu marido que diz que se recorda até hoje das imagens do noticiário. Política nem pensar, só se tornou assunto na casa depois que nos tornamos adolescentes. Sim, importante, nesses primeiros cinco anos a família aumentou, ganhei um irmão. Não me lembro da minha mãe grávida, mas lembro que achei que ele tinha um dedo a mais, o que fez todo mundo rir e me deixou furiosa.
Lembro do som arrastado dos passos do avô e dos seus chinelos de couro. Ele sentado na varanda, cabelos brancos e óculos. Minha mãe tentando desambaraçar meus cabelos e eu tentando fugir. A árvore de natal, os vasos de planta, os bolos de aniversário, o carnaval. Mas foi só quando entrei na escola é que passei a contar o tempo, aí sim.
1 Comments:
Sinto falta das suas postagens de muito bom gosto lá no fotolog.
Maravilhoso o seu blog.
bjos
lua e viola
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